O HOMEM CARRO
(Fátima Azevêdo)
Ele transita pelas avenidas, claudicando
no contra fluxo. O suor de sua pele, reflete-se assim como o sol, no para brisa dos carros. Ele caminha entre
nacionais e importados, como se houvesse uma pista feita única e exclusivamente
para ele. Não sei o seu nome, não sei onde mora. Mas sei que ao caminhar
desesperadamente como faz, de peito nu, bermudas sujas e rasgadas e pés
descalços, está a nos dizer algo que carecemos de entender. Somos muito
pequenos para tal. Eu reparo nele. Os carros parecem respeitá-lo. O Homem
Carro, como assim o chamo, anda quilômetros diariamente. Já o encontrei na BR
116, andando rapidamente na mesma velocidade e com o mesmo olhar perdido com o
qual o encontro na Avenida Washington Soares, a rodovia CE 040. Ele cruza a
cidade de Fortaleza, como que em penitência, em busca de salvação, em busca de
libertação. Pode ser visto bem cedo do dia, em pleno sol à pino ou ao
entardecer. Seus pés descalços, já calejados e queimados, não mais sentem o
asfalto quente. Mas seu coração, que se
vê à distância, assim como um semáforo
vermelho piscando, certamente sofre em
carne viva, com as queimaduras da vida. O Homem Carro é uma parte de nós.
(Fortaleza
16.09.14)